Tribunal do Santo Oficio
- SIBILOG INFOMEDIA

- 20 de mai. de 2021
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Instituída para combater heresias, a Inquisição, através do Tribunal do Santo Oficio, rapidamente se tornou uma oportunidade para perseguir opositores e adversários de Reis e de Papas. O Santo Oficio serviu de matriz ao ordenamento jurídico que ainda hoje rege o judiciário. Não surpreende pois que ele continue sendo utilizado com os mesmos objetivos.

Historicamente o primeiro Tribunal do Santo Oficio funcionou no século XIII em França com o objetivo de combater o Catarismo. Uma religião que, embora cristã, pregava um tipo de ascese pouco compatível com as grandezas e luxos praticados pela Igreja Católica Romana. Esta não descansou enquanto não aniquilou os Cátaros. Dessa época ficou para a história o tristemente famoso episódio em que Arnaud Amalric, legatário papal, comandou a tomada de Béziers, em 22 de Julho de 1209, onde homens, mulheres e crianças foram massacrados e a cidade saqueada e incendiada. Perguntado como distinguir os cátaros dos católicos, Amalric espondeu: “Matem-nos a todos! Deus conhecerá os seus”. E assim o movimento cátaro foi extinto.
Os Tribunais do Santo Oficio não eram estruturas permanentes. Eles eram instalados “on demand” para atender a necessidades do momento. Foi assim que eles ressurgiram em Espanha e Portugal no século XV e XVI quando os reis católicos sentiram a necessidade de unificar a Península Ibérica depois da Reconquista, perseguindo mouros e judeus.
Em Portugal a Inquisição surge como um arranjo de casamento: o rei D. Manuel I (1469-1521) queria casar com a filha dos reis católicos espanhóis D. Fernando e D. Isabel (1469-1516). Estes colocaram como condição que só aceitariam o casamento se o rei de Portugal parasse de acolher os judeus que eles haviam expulsado da Espanha e passasse a persegui-los. Trato feito. Em 1515 D. Manuel pediu autorização ao Papa Leão X para instalar a Santa Inquisição em Portugal tendo como missão perseguir os judeus e os muçulmanos. Embora ela só tenha vindo a ser instalada plenamente em 1536, já no reinado do seu sucessor, rei D. João III, seus efeitos perversos surtiram efeito imediatamente: em 1506, em Lisboa, teve lugar a Matança da Páscoa, uma multidão perseguiu e matou milhares de judeus, acusados de serem a causa de uma seca, fome e peste que assolavam o país. Os instigadores desse massacre foram severamente punidos por ordem do rei D. Manuel I mas a tragédia estava consumada.
O Tribunal do Santo Oficio, instalado em Portugal em 1536 foi oficialmente extinto em 1821. Durante quase 300 anos os cristãos-novos foram o principal alvo das perseguições. Em Portugal estava proibida desde 1497 qualquer profissão de fé que não fosse a católica. Foi dado um prazo aos judeus e outras confissões para se converterem ao catolicismo sob pena de serem presos ou expulsos de Portugal. Porém, apesar de convertidos, aqueles que ficaram nunca deixaram de ser perseguidos, suspeitos de continuarem a praticar de forma dissimulada a “lei de Moisés”.
Muitos fugiram para o Brasil onde, graças à distância e à ausência de uma estrutura burocrática, a perseguição era menos feroz. Nem por isso deixaram de ser perseguidos. Foram organizadas várias “Visitações do Tribunal do Santo Oficio às partes do Brasil” com o escopo de identificar os judeus, essa “raça infecta”. Os denunciados e identificados eram conduzidos a Lisboa para julgamento.
O modus operandi dessas visitações era deveras peculiar: Os Inquisitores desembarcavam em grande aparato e se acomodavam nos palácios e edifícios religiosos mais imponentes da cidade. Depois cuidavam de espalhar editais em todos os lugares públicos incitando a população a denunciar. Quem não denunciasse era tido como suspeito. Por isso as pessoas se apressavam a denunciar mesmo sem saber exatamente o quê. Muitas chegavam junto aos inquisitores e confessavam haver visto um vizinho a varrer a casa de fora para dentro, mas que nunca haviam imaginado que isso pudesse ser crime, mas já que os editais espalhados por todo lado informavam que esse era um dos sinais da pratica de judaísmo eles achavam por bem denunciar. Outras diziam conhecer um vizinho que nunca trabalhava ao sábado, outras uma comadre que não comia carne de porco, outras que, embora sem ter muita certeza, ouviram dizer que tal comerciante era cristão-novo mas continuava suas práticas judaizantes… Enfim, outras denuncias eram feitas por simples má-fé, apenas para atrapalhar um vizinho de quem não se gostava ou para prejudicar um concorrente de quem se invejava o negócio.

O Tribunal do Santo Oficio só processava “crimes” de heresia, blasfêmia, feitiçaria, sodomia, bigamia… mas não se ocupava de crimes tidos como laicos: tal como homicídio, roubo, agressões.. Quem confessasse seus delitos tinha penas mais brandas. Aquele acusado que negasse com veemência as acusações de que era objeto, era considerado herege e desafiador da cólera divina. Assim, era comum que muitos admitissem “crimes” que jamais haviam cometido só para não desencadear a “ira divina”.
O Tribunal do Santo Oficio também não se ocupava da execução das penas. Uma vez condenados, os “hereges” eram entregues à justiça secular que se encarregava de executar as penas que iam desde a penitência, passando pela prisão ou castigo, até chegar à pena máxima que era ser amarrado a um poste e queimado em praça pública, diante da população da cidade extasiada com o espetáculo.
Hoje, os descendentes desses perseguidos e condenados têm direito à nacionalidade portuguesa, ao abrigo do Decreto Lei nº 30-A/2015 de 27 de Fevereiro aprovado no parlamento português. Este decreto permite o exercício do direito ao retorno dos descendentes judeus sefarditas de origem portuguesa que o desejem, mediante a aquisição da nacionalidade portuguesa por naturalização, e sua integração na comunidade nacional, com os inerentes direitos e obrigações.



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